Além da
necessidade de aprovar projetos no Congresso para reformular o Bolsa Família, o
governo deverá ter dificuldade neste ano para bancar o novo programa, chamado
de Renda Brasil, com um amplo remanejamento de recursos da área social do
Orçamento.
A
ideia da equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) é usar verba do abono
salarial, seguro defeso (auxílio pago ao pescador artesanal) e outras ações
sociais e de assistência a serem fundidas em um único programa, que, segundo
técnicos, começaria a funcionar já no segundo semestre.
Dos R$ 20 bilhões do abono salarial, mais de R$ 14
bilhões já foram desembolsados. Esse benefício funciona como um 14º salário que
o governo paga a quem recebeu em média dois salários mínimos (R$ 2.090) em um
contrato com carteira assinada.
Além
disso, o calendário de pagamento é defasado. Quem trabalhou no ano passado e
cumpriu os requisitos começará a receber o abono salarial, cujo valor é de até
um salário mínimo (R$ 1.045), na próxima semana. O último lote está previsto
para junho de 2021. Ou seja, já há um compromisso de gastos com o abono -uma
das principais fontes de recursos para o novo Bolsa Família, segundo estudos do
time de Guedes- também no próximo ano.
Integrantes
do governo e economistas afirmam que as regras do abono salarial não podem ser
alteradas de forma repentina. Guedes já tentou, durante a reforma da
Previdência, reduzir as despesas com esse benefício, mas a ideia foi rejeitada
pelo Congresso. Para alterar as regras do abono, é necessário aprovar uma PEC
(proposta de emenda à Constituição), que depende de 60% dos votos em casa Casa
e tem tramitação mais lenta.
Nas
discussões da reforma da Previdência, o governo inclusive apresentou dados
mostrando que, mesmo se o Congresso aprovasse o corte no abono salarial, o
efeito da medida ocorreria após um ano e meio. Técnicos que trabalharam na
proposta reconheceram, nesta semana, a dificuldade em acessar esses recursos de
imediato. Se a PEC for aprovada em outubro, por exemplo, o fim dos compromissos
do governo com o pagamento do abono seria apenas em meados de 2022.
Procurado,
o Ministério da Economia afirmou apenas que o programa Renda Brasil está em
fase de elaboração e, por isso, não iria se manifestar.
"Eu defendo a extinção do abono. É uma política
torta, errada, mas esses recursos vão demorar a ficar livres no
Orçamento", disse o economista Marcos Mendes, colunista da Folha e um dos
criadores da regra do teto de gastos.
Ao lado do discurso otimista em relação à velocidade em
que conseguirá implementar o Renda Brasil, a equipe econômica tem ressaltado a
necessidade de manutenção da norma que impede um crescimento das despesas
públicas acima da inflação.
Por isso, o desafio é conseguir remanejar recursos dentro
do teto.
O orçamento do Bolsa Família é de R$ 32,5 bilhões e
atende cerca de 14,3 milhões de lares.
O
governo vai definir o valor do benefício do novo Bolsa Família de acordo com a
verba que conseguirá. Um dos cenários traçados prevê mais R$ 20 bilhões para a
reformulação do programa.
"Usar o orçamento do abono salarial é uma das
hipóteses. Se não der neste ano, a gente faz em outro. Mas estamos estudando
também outras soluções", afirmou o economista e professor da PUC-RJ, José
Márcio Camargo, que tem participado da elaboração do Renda Brasil com a equipe
de Guedes.
O grupo de técnicos vê o abono salarial como uma
importante fonte de dinheiro, pois, se extinto, permitiria realocar R$ 20
bilhões no novo programa social.
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