Enfim, para enxergar e caracterizar a neo-escravidão, é
necessário compreender que conceituar os objetos das ciências sociais é tentar
impor limites aos pensamentos: tarefa ingente; é tentar domar o vento ou calar
a tempestade: tarefa quixotesca. As ciências sociais são águas em ebulição, não
se aquietam, preferem evaporar-se a quedarem inertes nas mãos curiosas dos
pesquisadores. Hoje é; amanhã, quem sabe? Ao romper da aurora parece certo; no
crepúsculo, erro crasso. Inobstante os desafios, conscientes de que “o que a
beleza é para os olhos e a harmonia para os ouvidos, o conceito é para o
entendimento,”[2] opinamos no sentido de que é necessário o debate sobre
trabalho análogo à escravidão, por três motivos, pelo menos. Primeiro porque,
no campo conceitual, não se consegue aceitar uma ideia que não se compreende; segundo, porque não se aplica um conceito mal compreendido; terceiro, porque os
operadores do direito, de todas as classes, detêm consideráveis doses de livre
convencimento. Com base neste livre convencimento é fácil se esquivar da
aplicação de leis que não se acomodam na ideologia de quem deve promover a
justiça, mormente quando a sociedade aceita tacitamente as injustiças que se
cometem. O debate é um dos meios que se usa para desmascarar as injustiças.
Entre os tipos penais do artigo149 do Código Penal
Brasileiro, dois merecem ser debatidos com urgência: jornada exaustiva, em
virtude das mortes ocorridas nos canaviais, e o trabalho degradante por ser a
forma mais comum de crimes contra o ser humano praticado no âmbito da relação
de trabalho. O que é trabalho degradante? Como identificar um trabalho
degradante? Degradante é sinônimo de humilhante e deriva do verbo degradar; é o
ato ou fato que provoca degradação, desonra. Degradação é o ato ou o efeito de
degradar. Degradar é privar de graus, títulos, dignidades, de forma desonrante.
Degradar é o oposto a graduar, a promover; degradar é despromover. Degradante é
o fato ou ato que despromove, que rebaixa, que priva do estatus ou do grau de
cidadão; que nega direitos inerentes à cidadania; que despromove o trabalhador
tirando-o da condição de cidadão, rebaixando-o a uma condição semelhante à de
escravo, embora sem ser de fato um escravo. Portanto, trabalho degradante é
aquele cuja relação jurídica não garante ao trabalhador os direitos
fundamentais da pessoa humana relacionados à prestação laboral. O trabalho
degradante afronta os direitos humanos laborais consagrados pela Declaração
Universal dos Direitos Humanos e abrigados pela Constituição da República
Federativa do Brasil, assim como pela Consolidação das Leis do Trabalho e pelas
Normas Regulamentadoras, as já populares “NRs”, entre outras normas
jurídico-laborais.
Identifica-se um trabalho degradante passando a relação de trabalho
pelo crivo da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), pela
Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), pela Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT) e pelas Normas Regulamentadoras (NR).
Continua...
Nenhum comentário:
Postar um comentário