Quando estive no sertão de
Goiás vi uma cena horrível e rara, talvez única: vi uma jibóia engolir toda uma
enfiada de macacos!
Eis como:
Sabe-se que quando os
macacos querem atravessar um rio, não largo, o bando sobe a uma árvore alta, à
beira d'água, e lá uma vez em cima o capitão, que é o macaco chefe, engancha o
rabo num galho forte, dela; outro vem e engancha o rabo no terceiro, e assim
por diante, até o derradeiro; e quando assim estão todos presos, uns aos outros,
e portanto pendurados, como uma corda, nesse jeito começam a balançar-se de
vaivém a enfiada ganha impulso.
É como uma pêndula de
relógio ou como um badalo de sino, tal e qual!
Quando o macaco da ponta de
baixo consegue agarrar um ramo na margem oposta, prende-se a ele firmemente,
marinha pelo tronco acima e dá um grito: então o macaco da ponta de cima - o
capitão - da outra margem solta-se e - pronto! - a enfiada atravessou o rio a
pé enxuto.
Ora, uma vez,
silenciosamente, para não despertar os jacarés, eu descia em ubá um braço de
rio, justamente numa das voltas topei com uma enfiada que se balançava, para
fazer a travessia.
Parei logo de moita para ver
a interessante manobra.
Num dos balanços o macaco -
ponta - prendeu-se a um galho forte de uma enorme sucupira: mas quando ia a
galgar o tronco acima, uma senhora jibóia - uma jibóia - senhorita! - abocou-o,
faminta, e já foi engolindo como quem não encontra caroço nem espinha.
Com a dor do abocanhamento o
pobre macaco gritou desesperadamente; o capitão, na outra ponta, julgando que
era o sinal, desprendeu-se e a enfiada inteira bateu na água do rio!
E tanto caíram na água, os
macacos todos taparam os ouvidos com as mãos mas não se desenrabaram!
Fiquei com lástima daquela
atrapalhação e pus-me a gritar-lhes:
- Estúpidos! Soltem os
rabos! Burros! Aproveitem enquanto ela papa o primeiro! Desenganchem!
Qual! Os burros faziam
caretas? Guinchavam e não atinavam com a salvação, tão simples!
A jibóia nem o trabalho teve
de mover-se: engoliu o primeiro, o segundo, o terceiro e assim todos.
O último macaco, o capitão,
que era portanto o único que tinha a cauda livre, quando o companheiro da
frente - o penúltimo, pois o último macaco, quando isso viu, teve um rasgo de
herói, que me comoveu até as entranhas: disse adeus de mão para os dois lados,
e, enroscando no pescoço a própria cauda suicidou-se!
A jibóia, talvez admirando
aquele valente, não o tragou; mal engoliu o penúltimo, com a dentuça atorou-lhe
a cauda e então caiu sobre a barranca o corpo ainda quente do capitão da
enfiada: o suicidado.
E eu toquei minha canoinha
pra diante.
Por Roberto Cohen em 20 de
Novembro de 1999