A partir de 1º de março, quando entram em vigor as novas alíquotas de contribuição do INSS, o desconto sobre as bolsas de residência médica do país passará de 11% para 14%. O médico residente é filiado ao Regime Geral de Previdência Social como contribuinte individual. A residência médica é um programa de pós-graduação gerenciado pelo Ministério da Educação com regimento determinado pela Comissão Nacional de Residência Médica.
A divulgação do aumento reacendeu a discussão sobre a defasagem do valor das bolsas por parte das instituições representativas de médicos residentes no país. Desde 2016, o valor bruto pago pelo Ministério da Educação é de R$ 3.330,43 por mês para uma jornada de 60 horas semanais. Descontados 11%, o residente recebe R$ 2.964,09. Com o reajuste de 3% na alíquota, passará a receber R$ 2.864,17.
O presidente da ANMR (Associação Nacional dos Médicos Residentes), Euler Nicolau Sauaia Filho, disse à reportagem que o aumento na contribuição representa mais uma perda real e que o valor torna-se incompatível com o custo de vida brasileiro.
"É insuficiente para o objetivo da residência médica, que é a educação. O ideal seria reajustar a bolsa pela inflação e acrescentar os custos com moradia e alimentação. O residente deveria receber pelo menos R$ 5.000", diz Filho.
Representantes dos Ministérios da Saúde e da Educação, da Associação Nacional dos Médicos Residentes, da Associação Médica Brasileira e do Conselho Federal de Medicina se reuniram nesta quinta-feira (6) para discutir o assunto. No encontro, ficou acordado que os ministérios vão avaliar a proposta de reajuste da bolsa de residência médica e dar um parecer sobre o aumento da alíquota do INSS e se o aumento é previsto por lei. Os retornos serão apresentados às entidades médicas em nova reunião, prevista para ocorrer na semana que vem.
A incompatibilidade da bolsa com o custo de vida é um dos fatores que, somado a outros problemas, acomete a saúde dos médicos, dizem os profissionais. Residente em cirurgia geral no Hospital das Clínicas de São Paulo e diretora da Associação dos Residentes do HC, Renata Mancacci, 25, afirma que muitas instituições ultrapassam a carga horária de 60 horas sem acréscimo no valor da bolsa.
"Há residentes que vivem situações dramáticas para sobreviver. São médicos que, além da jornada estressante, precisam fazer plantões extras porque não podem contar com a ajuda da família e ainda devem separar tempo para o estudo e as aulas", explica Renata.
Na residência, os médicos são obrigados a cumprir um plantão de 12 horas na semana, que pode chegar a 24 horas. "Há casos em que o descanso obrigatório após o plantão não é respeitado", relata.
Mancacci e a ANMR afirmaram à reportagem que vêm crescendo os casos de depressão e síndrome de burnout -causada pelo esgotamento profissional- entre os residentes.
"A redução no valor da bolsa é significativa, se levados em consideração o custo de vida, os problemas de saúde e o pouco tempo que sobra aos residentes para estudar e descansar", comenta Filho.
Seu gasto mensal é de R$ 4.000 mensais e, para conseguir complementar a renda, Lucas é obrigado a cumprir plantões extras.
"É o momento de dialogar com as autoridades competentes, que não reconhecem a importância da nossa educação. Estamos em formação e precisamos estudar trabalhar, acompanhar a rotina do hospital, frequentar aulas e cumprir trabalhos científicos. Uma escala de trabalho árdua diminui o rendimento e afeta a saúde mental", afirma.
A ANMR estima que o país tenha 41 mil médicos residentes em atividade. Em nota, o Ministério da Saúde disse que participa de discussões para avaliar os reajustes dos valores das bolsas de residência médica, mas que a decisão é interministerial, envolvendo o Ministério da Educação, além dos estados e municípios.
A reportagem procurou o Ministério da Educação por email e telefone, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.
Sua saúde.com
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