A página do cantor e compositor Ivan Lins publicou uma foto com a seguinte mensagem: “Por 365 dias de consciência humana”.
Lindo
isso, se não estivéssemos no Brasil. Esse tipo de “grito” por “consciência
humana” exatamente no dia em que celebramos o Dia da Consciência Negra me soa como um reforço àquele
discurso extremamente conservador – do qual Ali Kamel e Demétrio Magnoli são
adeptos – segundo o qual “não existe racismo no Brasil”. Logo, não seriam
necessárias essas manifestações por afirmação identitária, como as que são
promovidas pelo Movimento Negro e que, aos poucos, vão sendo incorporadas como
parte dos esforços do poder público em reparar os erros e crimes que foram e
são cometidos contra a parcela negra da nossa população.
Quase
QUATRO QUINTOS da nossa História (é pouco isso?) foram vividos sob o regime
escravocrata. A escravidão não foi praticada indiscriminadamente contra todos
os seres humanos que aqui viviam até 1888. Não é possível que hoje queiramos
fingir para nós mesmos que as consequências da escravidão sejam ainda sentidas,
sem qualquer distinção, por brancos e negros.
Falar
que o Dia da Consciência Negra deveria ser substituído por um dia da “consciência
humana” no nosso país seria como sugerir que todo esse passado de violência
atroz contra os negros seja esquecido. Combinamos assim: “faz de conta que
ninguém foi tratado diferentemente em razão da cor de sua pele e, por isso,
hoje somos todos iguais. Humanos, com as mesmas oportunidades. Né?” Isso é o
cúmulo da falta de consciência histórica!
Se
os seres humanos não tivessem inventado um sistema de dominação que submete
outros seres humanos a um poder instituído com base na marginalização da
maioria em razão de traços como origem geográfica e cor da pele, aí sim, seria
lindo celebrar a humanidade como uma coisa harmônica.
Mas,
enquanto persistirem os efeitos dessas experiências de subjugação, exploração e
aculturação que se abatem sobre aqueles a quem foi negado até o direito de
serem reconhecidos e respeitados como seres humanos, temos a obrigação moral de
reconhecer que infelizmente, no estágio evolutivo em que nos encontramos hoje,
muito pouco há para se celebrar em razão do fato de sermos “todos seres
humanos”, mas há muito o que se lembrar a respeito de tudo o que já se fez
neste país contra seres humanos que, por causa da cor de sua pele, foram
subcategorizados como uma raça inferior não pertencente à espécie humana.
Não
entendo por que ainda há pessoas que preferem, depois de tudo o que passou,
fingir agora que sempre fomos todos bons amigos.
Quer
dizer, até entendo sim…
Fonte: Pragmatismo Político/Enviado pela leitora, Ana Maria Gorett - Valença Ba
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