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sábado, 29 de agosto de 2015

Contos & Causo - O hotel do Guedes





Lauro Guedes tinha nove filhos homens. Sustentava a todos com a renda do Hotel Brasil, de que era proprietário. Situado a uma quadra da Praça XV de Novembro, em São Borja, era praticamente a única hospedaria da cidade nos anos 40. Além dele a pensão de dona Miloca, do seu Gastão Ponsi e mais algumas menos credenciadas. Seu Guedes, como o chamavam, era o fac-totum do hotel. De estatura média, ágil de corpo, atendia portaria e cozinha, revisava quartos, fazia o rol das compras do dia e tinha tempo, ainda, para entreter longos papos com seus amigos mais chegados - dentre os quais o doutor Baglioni, o José Motta "da farmácia", o seu Raymundo "da Prefeitura" e mais alguns. Na portaria de seu hotel apenas uma pequena sala com uma escrivaninha e algumas cadeiras - o mate não parava nunca. Seu Guedes conversava com quantos chegassem, sabia as novidades da capital e de Santa Maria através dos viajantes que se hospedavam e as notícias do interior pela boca dos fazendeiros seus clientes.
Seu hotel, em termos atuais, não mereceria talvez -nem mesmo uma estrela. Salvo três ou quatro quartos de casal, os demais comportavam de duas a quatro,camas, além dos aposentos improvisados - no corredor, na sala de refeições - onde colocava colchões quando a lotação normal esgotava. O cardápio era espartano: arroz, feijão, carne frita, às vezes um pedaço de abóbora, batata doce ou aipim. Sobremesa e cafezinho eram luxos.
Os sanitários, por sua vez, não primavam pelo asseio. Tinham o fundamental: o vaso para as necessidades, uma pia, um chuveiro de água fria, fosse no inverno ou verão. Se alguém desejasse banho quente, seu Guedes providenciava um "bacilhão" de lata e uma chaleira grande de água fervente.
Um viajante novo, que se hospedava pela primeira vez no Hotel Brasü, teve necessidade de usar o sanitário. Fez o que tinha de fazer, veio à portaria e reclamou de seu Guedes: - O senhor não me leve a mal, mas seus banheiros não permitem nem mesmo que se vá aos pés com tranqüilidade. Milhares de moscas não deixam a gente nern mesmo abrir a boca. Seu Guedes nem se pertubou:

- É que o amigo não conhece os segredos do meu hotel. Quando desejar tranquilidade no sanitário - já vi que o senhor é um homem fino -, procure usá-lo na hora do almoço. Não vai encontrar uma única mosca.
- Mas como?
- É que na hora da bóia elas se mudam todas para o refeitório.


Por Roberto Cohen

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