Saúde pública não é
uma prioridade do governo do estado da Bahia. Dados do Sistema de Informações
sobre Orçamentos Públicos em Saúde (SIOPS) revelam que os investimentos na
saúde por parte do estado estão na contramão da necessidade do segmento.
Enquanto a população baiana sofre com estruturas precárias, falta de leitos e
carência de insumos, o governo estadual vem adotando a postura de reduzir cada
vez mais o aporte de recursos no setor.
De acordo com a Lei Complementar nº 141/2012, os estados
devem investir no mínimo 12% de suas receitas na saúde, enquanto os municípios
devem aplicar 15%. Na Bahia, segundo os dados do SIOPS, os recursos do governo
estadual estão cada vez mais próximos do mínimo legal, com 12,94% em 2014,
12,45% em 2015 e 12,26% no ano passado. Esse resultado coloca a Bahia na 21ª posição no ranking dos estados que menos
investiram em saúde em 2016 (confira aqui a tabela completa).
O coordenador do Centro de Apoio Operacional da Saúde
Pública (Cesau), promotor Justiça Rogério Queiroz, esclarece que esses 12%
estabelecidos na Lei Complementar nº 141 são o piso, ou seja, é o mínimo que
deve ser gasto. “O problema é que, no Brasil, os gestores estão transformando o
piso em teto. Se nós quisermos um plus para a
saúde, precisamos ampliar os investimentos. Não tem outra solução. Desta forma,
vai permitir apenas que a máquina rode tal qual roda hoje, com uma desassistência
imensa. Esse é o problema de transformar piso em teto”.
O promotor chama atenção ainda para uma particularidade
do estado da Bahia, que, em 2006, entrou com uma ação civil ordinária no
Supremo Tribunal Federal (STF) contra a União, para que a receita obtida com o
Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza (Facep) não seja incluída na
base de cálculo para apuração dos limites mínimos de gastos na saúde. “Isso
quer dizer que uma parte da arrecadação, que teoricamente seria computada para
se chegar aos 12%, não é. Isso justifica os percentuais do Portal da
Transparência da Bahia serem um pouco maiores do que os do SIOPS”.
Para a presidente do Conselho Regional de Medicina do
Estado da Bahia (Cremeb), conselheira Teresa Maltez, essa postura do governo
estadual é totalmente contrária a expectativa da população e da própria
categoria médica, ambas as vítimas da falta de financiamento. “Com essa
redução, fica difícil acreditar, ainda que no futuro, na oferta de uma
assistência pública de qualidade. Não podemos esquecer que, com a crise, a
conta do SUS só cresce. Afinal, muitos brasileiros estão deixando de ter plano
de saúde”, enfatiza.
O vice-presidente do Cremeb, conselheiro Júlio Braga,
afirma que essa redução nos investimentos por parte do governo estadual faz com
que a secretaria de Saúde tente repassar parte de suas despesas para os
municípios. “O fechamento dos hospitais psiquiátricos do governo estadual é um
exemplo claro disso. A medida, criticada pelos psiquiatras, repassaria para as
prefeituras os custos de residências terapêuticas e dos CAPS III”, pontua ele.
Ao mesmo tempo, os investimentos das prefeituras do
estado da Bahia nos últimos três anos foram no sentido oposto ao do governo
estadual. Segundo os dados do SIOPS, a média de aplicação de suas receitas na
saúde vem crescendo. Em 2014, 2015 e 2016 estes números foram de 19,7%, 19,8% e
20%, respectivamente. “Os municípios estão longe de investir o necessário em
saúde, mas ao menos estão caminhando no sentido contrário ao estado”, complementa
o conselheiro, destacando que o SIOPS revela que, no primeiro bimestre de 2017,
o estado aportou apenas 8% do arrecadado em saúde.
De acordo com o promotor de Justiça Rogério Queiroz, a
expectativa é que o estado feche o ano com 13% do arrecado com impostos em
saúde. “O Ministério Público trabalha com legalidade. Seria ótimo que o estado
investisse mais, mas não temos como exigir isso. Portanto, lamento essa falta
de regularidade para garantir o custeio”, pontua, complementando: “quase todo
dinheiro gasto na saúde é de custeio, ou seja, essa instabilidade tem gerado
inconsistência no custeio das atividades. É preciso uma regularidade para
manter os serviços funcionando”.
Penalidades – Em
caso de descumprimento dos percentuais mínimos por parte dos estados, pelo
Distrito Federal e pelos municípios, a Lei Complementar nº 141 prevê algumas
sanções, como a aplicação no ano subsequente da diferença, em reais e
corrigida, do valor não aplicado. “Vamos dizer que o estado gaste apenas 11%
este ano. Ano que vem terá de investir os 12% legais mais a diferença de 1% em
reais, devidamente corrigida”, explica o promotor. Além disso, a gestão fica
passível de bloqueio de repasses de verbas federais e ainda é motivo de ter as
suas contas reprovadas.
Procurada por meio da assessoria de comunicação, a
secretaria de saúde do Estado não se pronunciou sobre o assunto.
Fonte: Cremeb