O fazendeiro Neco Amâncio,
pai do sanfoneiro Zé de Neco, tinha um cavalo maravilhoso, grande, alto, de
porte imponente e domado no andar a trote de fazer inveja aos melhores
criadores e domadores e admiração aos, como eu, menino ainda, leigo em cavalos
e doma. O nome do cavalo era Pombo Roxo. Todo sábado havia até uma certa
expectativa entre a molecada da Rua Manoel Mariano, onde morava o filho de seu
Neco, para ver ele chegar de Dois Riachos montado no Pombo Roxo.
De longe se ouvia o bater de
cascos compassados do cavalo a trote, ou seja, sempre mantendo uma das patas no
chão, resultando assim num andar mais confortável para o cavaleiro que não é
sacolejado para cima e para baixo como no galope. Se não bastasse tanto, havia
ainda os arreios de Pombo Roxo, peças preciosas da arte em couro, feitas a
capricho por Vicente Celeiro, pai do nosso amigo futebolista Martinho Souto.
Eram rédeas, sela, bridão, buçal, peiteira, finamente trabalhadas e com adereços
de prata pura.
Tudo aquilo inflava o ego do
sertanejo Neco Amâncio, de trato rude e severo, mas que se desmanchava em
açúcar diante do menor elogio ao seu cavalo. Um belo dia Seu Neco levou um
rádio para meu pai consertar. Deixou de manhã e retirou à tarde, o conserto foi
simples e meu pai tinha a peça em estoque.
Como gastou mais do que
esperava com as compras e as bicadas, deixou para pagar no sábado seguinte, o
que não era problema nem novidade para um homem de palavra e com crédito sem
limites onde quer que fosse. No sábado seguinte chegou Seu Neco para pagar o
conserto do rádio e um dedo de prosa com Limeira, o meu pai.
Disse Seu Neco - Sabe
Limeira, sábado passado me demorei na conversa com Antonio Izidio lá perto da
ponte e já na metade do caminho começou a escurecer e ameaçar uma chuva. Fiquei
pensando em não molhar nem as compras nem o rádio e fiquei vigiando aquele
nevoeiro vindo na minha direção.
Apertei o passo do Pombo
Roxo e a chuva veio vindo e eu apertando o passo e a chuva vindo. Sentia o cheiro
da bruta molhando a poeira da estrada e Pombo Roxo sereno no passo.
Prá encurtar a conversa,
quando cheguei na fazenda, tinha molhado somente a garupa.
Texto do Advogado Gilberto
Carvalho Moura
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