Um menino debilitado, de
olhar caído e coberto de feridas da cabeça aos pés hipnotizou o servidor
público Mauro Bezerra, 49, durante uma visita a um abrigo de Garanhuns (a 232
km do Recife). Foi ali que ele decidiu: João (nome fictício) seria seu primeiro
filho e teria os mesmos direitos de qualquer outra criança adotada no país.
Onze meses depois, o garoto de quatro anos ganhava um sobrenome e uma casa. Mas
o pai, que é solteiro, queria mais do que ter um filho. Ele queria criá-lo. Depois
de ter o pedido negado pela SUDENE (Superintendência de Desenvolvimento do
Nordeste), onde trabalha há 20 anos decidiu recorrer à Justiça para obter
licença remunerada de 180 dias.
"Nunca tinha tempo para
conhecer o meu filho, trabalhava o dia inteiro. Quando o pegava na escola, ele
já estava dormindo. Continuávamos dois estranhos dentro de casa", conta.
Como servidor público,
Bezerra está submetido a uma lei que concede período de afastamento só às mães.
Os pais ganham no máximo cinco dias de licença. Em paralelo à lei, no entanto,
a Justiça já havia concedido os 180 dias de licença a mães solteiras e casais
homo afetivos que adotavam crianças recém-nascidas. Para o caso de Bezerra, pai
solteiro de uma criança que já não era mais recém-nascida, não havia
jurisprudência.
"A lei ainda acha que
apenas o recém-nascido adotado precisa de maior cuidado e se esquece daquele
que é adotado tardiamente. João carregava traumas da rejeição, de uma família
desestruturada", disse Leilane Mara, advogada do servidor. Desde 30 de
setembro, ele é o primeiro servidor solteiro no país a conquistar esse
benefício na Justiça federal. O juiz federal Bernardo Ferraz, do Tribunal
Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), afirma que concedeu a liminar amparada
pela Constituição.
"Não se pode
diferenciar filhos adotivos dos biológicos. Nesse caso, o servidor é pai e mãe
do menor e é dele que vem toda a dedicação a essa criança", afirmou.
"Eu sabia que o direito
do João existia. E fui atrás. Esses seis meses não são para mim, mas para a
criança. Eu acho que o nome do benefício deveria mudar de licença-maternidade
para licença-infância", diz o pai.
Com mais tempo para João, o
servidor público diz que o filho é outra criança.
"O João está mais
calmo, consegue socializar bem com os colegas da escola. Hoje já me chama de
pai", diz.
No futuro próximo, o
servidor prevê aumentar a família, com um irmão mais novo para João. Mas,
antes, diz o servidor, um desafio precisa ser superado. "Eu adotei o João
ali, naquele primeiro encontro. Agora, preciso ser adotado como pai."
ASCOM Força Sindical
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